No artigo de hoje, trago a recente decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ – 13.07.2025), amplamente divulgada e que marca um divisor de águas no direito de família.
O entendimento firmado permite que bens adquiridos por um cônjuge em novo casamento sejam utilizados para saldar débitos alimentares não quitados no primeiro vínculo. Tal inovação jurídica reforça a prioridade absoluta da criança e do alimentando na hierarquia de proteção constitucional, senão vejamos:
1. Fundamentação jurídica
O STJ posicionou-se com rigor ao lembrar que os alimentos têm natureza alimentar e caráter alimentar peremptório. A falta de pagamento não se dilui em disputas patrimoniais, sendo vedadas manobras que prolonguem a mora. Assim, permite-se que ativos vinculados à nova sociedade conjugal respondam pelas dívidas anteriores, desde que comprovada a capacidade econômico-financeira suficiente para saldá-las.
2. Proteção da dignidade e dignidade da pessoa humana
A decisão está em consonância com os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e da proteção integral da criança. Negar meios executórios eficazes para cumprimento da obrigação alimentícia seria abandonar os mais vulneráveis. Portanto, a mobilização de patrimônio do novo casamento se impõe como medida de justiça material, não implicando – salvo prova em contrário – enriquecimento indevido da parte credora.
3. Limites e garantias processuais
Não se trata de liberalidade: para alcançar o patrimônio do novo vínculo, exige-se demonstração clara de que existem verbas indisponíveis no patrimônio individual do alimentante. Cabe ao juiz realizar exame caso a caso, com observância ao contraditório e à proporcionalidade. O novo cônjuge também se beneficia: não há penhora automática de bens comuns, e eventuais exceções podem ser levantadas para preservar a dignidade do novo núcleo familiar.
4. Implicações práticas para advogados e famílias
Em suma, no plano prático, a decisão do STJ exige atenção redobrada dos operadores do direito e das famílias envolvidas. Para os advogados dos alimentandos, é essencial reforçar nos pedidos executórios a comprovação de déficit patrimonial do devedor e anexar provas robustas que demonstrem a existência e a composição do novo patrimônio adquirido. Já os advogados dos alimentantes ou dos novos cônjuges devem elaborar estudos socioeconômicos detalhados, evidenciar a comunhão ou separação patrimonial e, se necessário, alegar eventual abuso ou desproporcionalidade na medida judicial. Aos casais em nova união, recomenda-se desde já um planejamento patrimonial consciente, que considere, por exemplo, a adoção de regimes como a separação total de bens ou a celebração de pacto antenupcial, de modo a proteger o novo núcleo familiar sem infringir obrigações preexistentes.
O acórdão do STJ representa avanço significativo na luta pela efetividade do direito alimentar. A incorporação do patrimônio constituído no novo casamento como fonte de adimplemento é coerente com o espírito constitucional de proteção integral e dignidade humana. Restam, porém, desafios: como proteger o novo núcleo familiar e garantir que execuções sejam pautadas pela razoabilidade. O papel dos advogados será vital para harmonizar eficácia jurídica com justiça social.
Por hoje é só, até a próxima!
Escrito Pelo Advogado Joner Nery
(*) O autor é advogado inscrito na OAB/SP sob o n° 263.064, pós-graduado em Direito e Processo do Trabalho e Especialista em Direito do Consumidor, ex-diretor do Procon São Carlos/SP e ex-representante dos Procons da Região Central do Estado de São Paulo, Presidente da Comissão de Proteção e Defesa do Consumidor da 30ª Subseção da OAB/SP.
