Educação investe em inteligência artificial para inclusão
Pasta adquire 70 unidades do OrCam, tecnologia revolucionária que facilita o acesso dos deficientes visuais ao conhecimento
Somar as inovações da inteligência artificial para avançar no trabalho de inclusão no ensino. Foi com este objetivo que o secretário municipal de Educação de São Carlos, Roselei Françoso, investiu R$ 1 milhão na aquisição de 70 unidades do OrCam MyEye, a mais avançada tecnologia para auxiliar pessoas com deficiência visual, promove inclusão na vida social e profissional.
O dispositivo tem câmera intuitiva acoplada à armação dos óculos do usuário e fotografa, escaneia e transforma textos de qualquer superfície em áudio, além de reconhecer rostos e produtos. Todas as escolas e a salas de recursos, além da Secretaria Municipal de Portadores de Deficiência estão dotados da nova tecnologia.
A professora de educação especial Ivone Camargo, que atua no Espaço Braille, afirma que a inovação está sendo ótima para a inclusão dos alunos. “Este dispositivo transforma o papel do aluno, que antes era apenas ouvinte para um aluno autônomo. O OrCam identifica os professores que são cadastrados pelo aluno, fala as horas, identifica as cores e lê os textos e as interpretações de texto. Assim, o aprendizado do aluno é infinitamente mais rápido e completo. É um grande avanço rumo à educação inclusiva”, ressalta ela.
O secretário Roselei Françoso destaca que o papel do poder público é investir em novas tecnologias para facilitar o acesso do estudante ao conhecimento. “Em São Carlos, conhecida como ‘Capital da Tecnologia’, temos a satisfação de poder investir num método revolucionário como este na luta pela inclusão de todos”, afirma ele.
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL
Dotado de tecnologia revolucionária, o dispositivo oferece independência às pessoas cegas ou com baixa visão. De acordo com a Organização Mundial de Saúde, há mais de 250 milhões de pessoas com deficiência visual em todo o mundo. No Brasil, dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que essa população é de 582 mil cegos e 6 milhões de pessoas com baixa visão. E, em sua maioria, elas têm acesso mais restrito à educação, à cultura e ao mercado de trabalho.
“Cerca de 80% das atividades que realizamos no dia a dia estão relacionadas à leitura. O OrCam MyEye proporciona, como ferramenta de visão artificial, o acesso à informação, esteja a pessoa onde estiver, e sem a necessidade de conexão à internet”, avalia Doron Sadka, diretor da Mais Autonomia, empresa que tem como missão disponibilizar no país o que existe de mais avançado no mundo para pessoas com deficiência.
O Orcam MyEye consiste em uma câmera inteligente intuitiva que pesa apenas 22,5 g e mede 7,6 cm por 2,1 cm. Acoplada à armação dos óculos do usuário, é capaz de detectar textos em português, inglês e espanhol, seja em livros, revistas, jornais, cardápios, documentos, placas de ruas, textos no celular, tablets e computadores, embalagens, letreiros de lojas e placas indicativas, por exemplo. Sua velocidade pode ser controlada, possibilitando a leitura de 100 a 250 palavras por minuto; permite escolher entre voz masculina e feminina; e tem comandos para pausar, adiantar ou retroceder a leitura – tudo isso offline.
O aparelho consegue ainda identificar cores e tonalidades, reconhecer pessoas e gêneros, rostos, informar a data e hora com um simples gesto de girar o pulso, cédulas de dinheiro (reais, dólares e euro) e identificar produtos pelo código de barras. Após o reconhecimento, retransmite a informação discretamente no ouvido do usuário.
O executivo explica que o Orcam MyEye amplia as possibilidades dos deficientes visuais no mercado de trabalho, permitindo que ocupem funções até então desafiadoras e oferecendo mais independência. “Uma pessoa cega pode, com o uso do aparelho, trabalhar de maneira mais adaptada em diversas funções. Para o recepcionista de uma empresa, por exemplo, o dispositivo auxilia revelando quantas pessoas estão à sua frente, se são homens, mulheres, meninos, meninas ou crianças e, caso já seja alguém cadastrado, o aparelho informa o nome por meio da identificação memorizada”, completa. O Orcam MyEye possibilita também o desenvolvimento de pessoas com dislexia, déficit de leitura ou analfabetismo.
EXEMPLOS DE INCLUSÃO
“Com o OrCam MyEye, consegui pela primeira vez folhear livros em uma livraria. Difícil descrever a sensação porque muitas vezes não valorizamos nossa liberdade de escolha, que de tão simples, esquecemos de lembrar. Isso é inclusão. Poder escolher uma ou várias formas para ter acesso a leitura”, afirma Marina Guimarães, escrevente do tribunal de Justiça e bailarina da associação Fernanda Bianchini – Ballet de cegos.
“Vai ajudar na escola porque eu não vou precisar mais de auxiliar – é só eu olhar para o livro, apontar ou apertar o play, que ele vai ler para mim”, comenta Giulia Rodrigues, filha do ex-jogador Roger, da Ponte Preta.
“A tecnologia do OrCam MyEye é fantástica e eficaz. A OrCam conseguiu juntar em um único equipamento tudo aquilo que a gente busca em vários aplicativos no celular”, João Anadão, analista de sistemas do Banco Itaú.
“Um dos meus sonhos era sentar em um trem do metrô ou ônibus e abrir o meu livro ou revista para ler como qualquer um. Hoje, graças a Deus e a tecnologia da OrCam posso fazer isto”, relata Jucilene Braga, psicóloga e coaching.
Em 2018, a prefeitura de São Paulo adquiriu dispositivos Orcam MyEye para todas as 54 bibliotecas do município. Juntas, elas possuem acervo de 5 milhões de títulos e proporcionam um gigantesco exemplo de programa de inclusão que democratiza o acesso de pessoas com deficiência visual, dislexia ou dificuldade de leitura à cultura, à educação, à vida social e ao mercado de trabalho.
Desde 2020 até 2021, o governo do Estado de Goiás adquiriu dispositivos Orcam MyEye para todos os 152 alunos com deficiência visual do estado. Disponibilizados em sistema de comodato pela SEDUC-GO ao aluno até a conclusão do ensino médio em suas escolas das redes municipais e estaduais.
Em 2021, a Prefeitura de São José dos Campos, no estado de São Paulo, adquiriu 100 dispositivos OrCam para os alunos com deficiência visual matriculados em suas escolas.
Sorocaba também adotou o caminho de uma educação mais acessível, disponibilizando 50 dispositivos para os alunos cegos ou com baixa visão do município.
O governo do Estado da Bahia também está investindo em acessibilidade educacional: já foram contemplados cem alunos com o dispositivo e a meta para 2022 é atender os demais alunos cegos ou com baixa visão do estado.
ESPECIALISTAS
A oftalmologista Juliana Sallum, professora do Departamento de Oftalmologia da Unifesp e diretora do Instituto de Genética Ocular, diz que o OrCam MyEye é uma ferramenta excelente para melhorar o dia a dia dos pacientes. “Devolver a capacidade de leitura inclui na sociedade a pessoa com deficiência visual”.
“O OrCam MyEye tem um potencial de aplicação enorme, não só para deficientes visuais, mas também para pessoas com transtorno de desenvolvimento e com dificuldade no processo de leitura, seja por distúrbios cerebrais ou por problemas de aprendizagem. Leve, funcional e prático, o aparelho amplia a qualidade de vida das pessoas que tem necessidades específicas relacionadas a dificuldade de decodificação visual”, relata Mauro Muszkat, coordenador responsável e criador do Núcleo de Atendimento Neuropsicológico Infantil Interdisciplinar (NANI) do Departamento de Psicobiologia da UNIFESP.
OS FUNDADORES
A OrCam foi fundada conjuntamente por Amnon Shashua, professor da Universidade de Jerusalém e pelo empreendedor Ziv Aviram, atual CEO da empresa. Em 1999, eles idealizaram um carro autônomo, que não causasse acidentes e garantisse segurança ao volante ao criarem a startup Mobileye. Referência no universo da inteligência artificial, a startup foi vendida no início de 2017 por 15,3 bilhões de dólares para a INTEL, valor mais alto já pago na história israelense para uma empresa de tecnologia.
Durante suas pesquisas, os sócios conseguiram desenvolver um algoritmo que possibilita a detecção de objetos no campo da visão de uma câmera. Em 2010, a tecnologia de inteligência artificial criada por eles foi aplicada para humanos com a criação da startup OrCam. A missão da OrCam é aproveitar o poder da visão artificial e da tecnologia vestível para ajudar pessoas com deficiência visual. Com um valor de mercado de 1 bilhão de dólares, a OrCam pretende realizar IPO até o final de 2021.