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Novas proteínas podem trazer cura da Doença do Sono

23/03/2013 20h39 - Atualizado há 11 anos Publicado por: Redação
Novas proteínas podem trazer cura da Doença do Sono

O Trypanosoma brucei é um protozoário flagelado causador da Doença do Sono em humanos e Nagana em animais, como o gado. Em seres humanos a enfermidade atinge, principalmente, a população da África subsaariana. Nessa região, mais de 60 milhões de pessoas vivem em áreas de risco e estima-se que 70 mil já estejam infectadas pela doença* que, em muitos casos, pode ser fatal, causando a morte dos contaminados.

 

Estudiosos com o foco voltado para cura dessa doença há alguns anos identificaram no Trypanosoma brucei uma novidade: três proteínas que possuem em sua cadeia polipeptídica o 21º aminoácido**, denominado de selenocisteína (Sec ou U).

Com pouca bibliografia sobre o assunto em mãos, os pesquisadores sabiam que estavam diante de uma novidade que, já no presente, abria novas possibilidades de estudo e, inclusive, uma porta para produção de um fármaco capaz de combater efetivamente a Doença do Sono.

Interessada nesse novo estudo, a doutoranda do Grupo de Cristalografia (GC) do Instituto de Física de São Carlos (IFSC/USP), Jaqueline Pesciutti Evangelista, sob orientação do docente, Otavio Henrique Thiemann, tem dedicado sua pesquisa a essa recente descoberta.

No entanto, o processo para transformar qualquer uma das selenoproteínas (nome dado às proteínas com algum resíduo de Sec) em um fármaco é longo, e um dos mais importantes passos é conseguir identificar qual o papel da proteína no organismo do protozoário. “Por possuírem esse aminoácido a mais, as selenoproteínas possuem vantagens, únicas em relação às homologas que possuem cistenínas***, como a atuação em reações de oxidorredução, uma das principais funções das selenoproteínas ”, explica Jaqueline.

No entanto, a doutoranda já percorreu algumas etapas importantes: clonou as selenoproteínas e inseriu seus genes na bactéria Escherichia coli para produção da proteína recombinante. Foi nas etapas seguintes, de expressão e purificação, que apareceu uma pequena surpresa. “Na expressão e purificação das três selenoproteínas encontradas, a única que apresentou um resultado que permitiria a continuidade do trabalho foi a do tipo Sel-T”, conta a doutoranda.

Dizer que mais se expressou significa que foi produzida em maior quantidade pela bactéria, tornando sua análise mais favorável. E nessa análise descobriu-se que a Sel-T não poderia ser analisada da mesma maneira que outras selenoproteínas por ser, especificamente, uma proteína de membrana, não sendo essas proteínas estudadas geralmente pela maioria dos grupos, devido a dificuldades técnicas intrínsecas que representam. “Vimos, então, que ela precisava de uma análise diferenciada”, relembra.

Primeiramente, Jaqueline isolou a Sel-T (proteína), encontrando um detergente específico para isso. “Testei todos os detergentes que tínhamos aqui no IFSC, e um deles respondeu bem”, conta.

Mas, para continuidade bem sucedida do estudo, ela necessitava de instrumentos específicos, não encontrados nos laboratórios do IFSC, o que a levou a realizar um estágio de 22 dias no Membrane Protein Laboratory (MPL) em Harwell (Inglaterra). “Já tinha chegado até a etapa de purificação, mas não conseguia caracterizar a proteína, ou seja, analisar seu formato, tamanho, pois nada disso se encontra descrito na literatura, e não era possível obter tais informações com os instrumentos que tínhamos em mãos”, relembra. “Foi quando eu soube por uma amiga que a pesquisadora Isabel de Moraes, do MPL, vinha para Campinas ministrar um curso de técnicas em proteínas de membranas. Entrei em contato com ela e combinamos o meu estágio****”.

No MPL, Jaqueline utilizou-se de outra linhagem da bactéria Escherichia coli, denominada C43, que possui modificações genéticas tornando-a, portanto, mais apta a expressar proteínas de membrana. Dessa forma, ela obteve um bom rendimento na produção da proteína Sel-T. Jaqueline também testou diversos detergentes utilizados para proteínas de membrana e fez a análise de seu estado, utilizando-se de equipamentos que o Brasil não possui.

Além de ter conseguido descobrir o melhor detergente para isolamento e purificação de proteínas de membrana, Jaqueline pôde observar a estabilidade da Sel-T, o que permite que ela siga à etapa de caracterização. “Agora tentaremos produzir e cristalizar a proteína para resolução de sua estrutura tridimensional. Assim, poderemos visualizar seu sítio ativo, como ela se aloja na membrana e deduzir a sua função no Trypanosoma”.

Sobre seu contato com um laboratório de pesquisa no exterior, ela destaca que alguns procedimentos futuros talvez tenham que ser feitos em Harwell, mas que uma colaboração já foi firmada entre o IFSC e o MPL para dar continuidade (e complementaridade) à pesquisa. Já sobre o retorno individual, ela conta que a oportunidade de poder visitar o exterior pela primeira vez e ter um contato direto com o inglês foi muito importante. E finaliza dizendo que o melhor resultado dessa experiência foi a parceria surgida entre os pesquisadores. “A parceria está feita e a porta está aberta. Isso, sem dúvidas, é a maior celebração que eu trouxe de lá”, finaliza.

*Informação retirada do site ”Médico sem fronteiras”

** Essa nova cadeia é o resultado da expansão do código genético de 20 para 22 aminoácidos

*** Um dos aminoácidos codificados pelos genes e parte integrante das proteínas dos seres vivos

**** O estágio de Jaqueline foi financiado pelo financiado pelo Grupo de Cristalografia (CG), pela Pró-reitoria de Pós-graduação (PRPG) e pela Comissão de Relações Internacionais do IFSC (CRInt)

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