Brasil amplia cooperação com China
Mas governo Lula evita adesão formal à Rota da Seda
Felipe Frazão/AE
Os presidentes de Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, e China, Xi Jinping, assinaram na quarta-feira, em Brasília, 37 acordos, incluindo a abertura de mercado para produtos agrícolas, cooperação tecnológica e investimentos. Embora a visita de Xi tenha aproximado as maiores economias de Ásia e América Latina, ela não rendeu a adesão brasileira à Rota da Seda, o programa de investimento chinês.
A China é a principal parceira comercial do Brasil, mas o governo brasileiro é cauteloso quando aderir oficialmente à Rota da Seda, para não perder autonomia geopolítica, mergulhando de cabeça em uma relação econômica com os chineses e sob o risco de alijar o segundo maior parceiro comercial do País: os EUA, especialmente a poucas semanas de Donald Trump voltar à Casa Branca.
Por isso, o Brasil fala apenas em “sinergia” entre os dois modelos de desenvolvimento, brasileiro e chinês. Na prática, embora tenha recusado a entrar na Rota da Seda, o governo brasileiro deixa a porta entreaberta, selecionando os financiamentos que achar melhor. Criada em 2013, a iniciativa tem como objetivo ampliar a influência chinesa em mais de 150 países por meio de dinheiro para projetos de infraestrutura.
O governo Lula estava sob pressão, sobretudo dos EUA, que mandaram recados por meio de altos funcionários enviados ao Brasil. Com a mudança na Casa Branca, a expectativa é que a pressão aumente, principalmente por parte de Marco Rubio, um senador anti-China indicado por Trump para chefiar a diplomacia americana.
“Estamos determinados a alicerçar nossa cooperação pelos próximos 50 anos em áreas como infraestrutura sustentável, transição energética, inteligência artificial, economia digital, saúde e aeroespacial”, disse Lula, que anunciou a criação de duas forças-tarefa, uma sobre cooperação financeira e outra sobre desenvolvimento produtivo e sustentável.
POLÍTICA EXTERNA
“Chegamos a novos consensos estratégicos sobre o futuro do desenvolvimento das relações China-Brasil”, disse Xi, que pediu apoio de Lula para defender o “verdadeiro multilateralismo” diante do “confronto” e da “hegemonia”, outra referência ao isolacionismo de Trump.
Na prática, os acordos de ontem significaram o aval da China para a exportação de alguns produtos brasileiros: farinha de peixe, óleo de peixe e outras proteínas e gorduras derivadas de pescado para ração animal. Os chineses também permitiram a importação de sorgo, gergelim e uva fresca. O potencial comercial, segundo o Ministério da Agricultura, pode chegar a US$ 450 milhões por ano.
Outro acordo assinado foi com a empresa chinesa SpaceSail, concorrente da Starlink, do bilionário Elon Musk. Os chineses estão desenvolvendo um serviço de internet de alta velocidade por meio de um sistema de satélites de órbita baixa, tecnologia vista como solução para conectar regiões de difícil acesso à infraestrutura de telecomunicações tradicional.
Outro resultado prático da visita de Xi foi um acordo assinado para que o BNDES capte R$ 4 bilhões com o Banco de Desenvolvimento da China (CDB), um contrato inédito já que tudo será feito em yuan, a moeda chinesa. Brasil e China estão entre os países que mais trabalham para reduzir a dependência do dólar para transações internacionais. A desdolarização do sistema financeiro e comercial é outro tema sensível para os EUA, que o contra a iniciativa.
CNI
A Confederação Nacional da Indústria (CNI) assinou memorando de entendimento com a universidade pública chinesa Tsinghua que estabelece as bases para a cooperação em inovação e tecnologia. Em nota, a CNI informou que as tratativas para essa parceria tiveram início em junho, em Pequim, durante missão governamental do Brasil à China que foi acompanhada pela indústria brasileira.
De acordo com a entidade, o objetivo do memorando, assinado por ocasião da visita do presidente da China, Xi Jinping, a Brasília, é fortalecer a cooperação internacional entre a CNI, a universidade chinesa e outras instituições públicas e privadas.
“A iniciativa também busca ampliar a colaboração entre as instituições para promover programas de mobilidade e formação de especialistas e estudantes, conectar ecossistemas de tecnologia e inovação, realizar pesquisas conjuntas, criar um ambiente favorável ao desenvolvimento de negócios e desenvolver, em conjunto, novas rotas tecnológicas e comerciais”, informa a CNI
Para o presidente da entidade, Ricardo Alban, o futuro da agenda entre Brasil e China deve ser baseado em pautas como a inovação tecnológica, para impulsionar essa parceria econômica e comercial que já dura 50 anos. “Temos o interesse comum de aprofundar o desenvolvimento acadêmico, tecnológico, de inovação e de negócios para fortalecer a cooperação internacional, e o memorando com a Tsinghua corrobora essa mobilização de esforços”, afirma.