(*) Rui Sintra
Vamos ser sinceros: quando um português casa com uma brasileira, não está só escolhendo um par — está assinando um contrato vitalício com uma montanha-russa emocional que vem com trilha sonora de samba, tempero de pimenta e um volume de voz que dispensa viva-voz. Mas calma — não é desespero, é amor. Um amor temperado, animado e, às vezes, ligeiramente barulhento. E, o melhor de tudo é que é recíproco. Eu, português de gema, tradicionalmente mais reservado, metódico e com um apreço quase sagrado por silêncio, de repente me vi encantado por uma mulher que não só fala com as mãos, mas também com os olhos, com o cabelo e, se for preciso, com a vassoura. Ela é intensidade pura — do tipo que chora vendo comercial de margarina e dois minutos depois está rindo de cair no chão porque o gato tropeçou no tapete. Acostumado a debates longos sobre vinhos e a refletir três dias antes de comprar um par de meias, de repente aprendo que é possível decidir o destino de um fim de semana em dois minutos, enquanto ela passa batom, segura o celular com o queixo e xinga quando o cabelo não adquire a forma que quer. Mas, por que me casei com ela? Porque, no fundo, todo português esconde uma alma romântica que precisa de estímulo. E não há nada mais estimulante do que ouvir “meu amorzinho, cadê tu?” aos berros no celular em pleno supermercado. Ela não manda indireta, manda direta com mira laser. E isso, para o português, como eu, é libertador. Acostumado com o “talvez”, “logo se vê”, “é pá, não sei…”, encontrei nela alguém que diz: “Quero. Agora. E com batata frita.” Mas, o que ela viu em mim, que sou portuga? Certamente, uma criatura rara: alguém que escuta (às vezes resmunga, mas escuta), que respeita o espaço dela, que divide a conta, que planeja o futuro e que ainda sabe fazer um chouriço assado. Para ela tudo isso é importante, mantendo inalterável seu charme tímido, um sotaque que faz “leite” virar poesia, e uma seriedade que, quando quebra para sorrir, derrete qualquer defensiva. Claro, há desafios! Por exemplo, eu acho estranho comer doce de leite com tudo, ou comer farofa, pois me lembro de areia da praia. Ela acha que bacalhau não precisa ter nome e sobrenome, enquanto eu acho que o Carnaval é um exagero. Ela acha que eu preciso urgentemente de terapia para aprender a relaxar, enquanto eu acho que preciso de pelo menos três meses para apresenta-la à família e amigos. E quando surgem os filhos? A coisa ganha um novo nível de comédia: a criança cresce bilíngue em português. Chama chinelo de “havaiana”, mas sabe o que é uma “pantufa”; come “pão francês” no café e “pão com chouriço” à noite; canta Galinha Pintadinha com sotaque de Lisboa e grita “ôxe” quando perde o brinquedo. Mas, o elo mais forte desse casamento luso-brasileiro é, sem dúvida, o humor. Porque apesar de vivermos em ritmos diferentes — eu com alma de fado e ela com espírito de axé e ginga de samba, os dois rimos juntos. Rimos do caos, das gafes culturais, dos mal-entendidos linguísticos (quem nunca ficou em silêncio constrangedor ao ouvir um “vou dar um jeito em você”), e principalmente, um do outro — com carinho, claro. No fim das contas, o que leva um português a casar com uma brasileira é mais do que amor. É coragem – e eu que diga! Coragem para mudar, para rir de si mesmo, para aprender a dançar mesmo com dois pés esquerdos, para entender que viver pode ser bem mais divertido quando se está com alguém que transforma qualquer segunda-feira chuvosa em prévia de feriado. E cá entre nós, querido leitor, depois de experimentar uma relação assim, nem o mais racional dos portugueses quer voltar a uma vida comedida. Porque casar com uma brasileira pode ser imprevisível, intenso, às vezes exaustivo… Mas é, sobretudo, inesquecível, amor puro!
O autor é jornalista profissional/correspondente para a Europa pela GNS Press Association / EUCJ – European Chamber of Journalists/European News Agency) – MTB 66181/SP.
Esta coluna é uma peça de opinião e não necessariamente reflete a opinião do Jornal Primeira Página sobre o assunto.