3 de Dezembro de 2023

Dólar

Euro

Cidades

Jornal Primeira Página > Notícias > Cidades > São Carlos era ‘Torre de Babel’ com novas tecnologias

São Carlos era ‘Torre de Babel’ com novas tecnologias

Cidade era gestada com gosto e cheiro de café recebendo italianos e outros imigrantes, tendo ferrovia e invenções e discriminando os negros

15/11/2023 08h05 - Atualizado há 3 semanas Publicado por: Redação
São Carlos era ‘Torre de Babel’ com novas tecnologias

Uma cidade que se consolidava sob o ritmo da produção incessante de café, que via casarões serem erguidos, gente chegando de vários cantos do mundo e novas invenções que mudavam o cotidiano. Foi esta São Carlos que, de forma atônita e até incrédula, recebia a notícia da Proclamação da República. Outra novidade eram os afrodescendentes, que agora eram homem livres. O telegrama do jornal da cidade recebeu a notícia no final da tarde daquele 15 de novembro de 1889 e os republicanos desfilaram pelas ruas cantando a Marselhesa.

A Proclamação da República representou o fim do Segundo Reinado e o início do período republicano. Desde a Guerra do Paraguai, os militares fortaleceram-se como grupo social e almejavam maior participação na política. E foi justamente um levante miliar o responsável pela deposição do segundo imperador brasileiro. Logo após a instalação da República, a família real foi exilada na França. Os militares foram influenciados pelos ideais positivistas e se mostraram como “salvadores da pátria”.

“A Proclamação da República não era algo esperado, mesmo que já existissem tensões e embates entre as correntes políticas monarquista e republicana naquele momento, uma mudança de sistema político no Brasil não parecia que surgiria de um dia para o outro. Tanto foi assim que, inicialmente, a notícia não foi considerada, sendo aceita apenas quando o Governo Provisório de São Paulo enviou à Câmara de São Carlos um telegrama informando dos acontecimentos”, ressalta a historiadora da Fundação Pró-Memória de São Carlos, Leila Massarão.

 

Período de instabilidades políticas

O período anterior à chegada da República foi marcada por uma grande crise política, apesar de toda a riqueza obtida com o café. “Para os anos imediatamente anteriores à Proclamação da República e a recente Abolição da Escravatura, a economia, mesmo tendo o café como principal produto para exportação, gerador de capitais e recursos, havia instabilidades políticas e econômicas em todo Império o que contribuiu para os movimentos contra o governo vigente e o aumento de ações visando uma revolução política, que refletisse no social e econômico. Para estes momentos, ex-escravizados e imigrantes estrangeiros recém-chegados representavam mais um problema, uma vez que o país não tinha condições de assistir essas populações, tanto em aspectos sociais como trabalhistas, o que gerava mais focos de tensão, no campo e na cidade”, destaca Leila.

A elite política são-carlense, antes toda ligada umbilicalmente à Monarquia, logo se adaptou ao novo regime. “Assim como em outros momentos da historia nacional e mesmo local, as fronteiras ideológicas e políticas estiveram frágeis, tanto que a proclamação foi aceita pelos vereadores são-carlenses rapidamente. O Conde do Pinhal, mesmo que fosse líder do partido Liberal monarquista, logo voltou a atuar, inclusive, como senador da República, antes de se aposentar definitivamente – considere também que seus irmãos mais novos, Bento Carlos e Paulino Carlos, eram membros e apoiadores do Partido Republicano Paulista, sendo que o segundo foi deputado na República e líder político botelhista em São Carlos”, destaca a pesquisadora.

O outro grande político e fazendeiro de São Carlos, Cunha Bueno, se afastou da política, mas manteve seus familiares no poder. “Já no caso do Visconde da Cunha Bueno, do Partido Conservador monarquista, mesmo sendo chegado ao Imperador Pedro II, a época da Proclamação, já havia se desligado do partido por não concordar com os rumos políticos daquele momento e não tomou novamente espaço na política nacional ou local – há referências, porém, da atuação de seu filho na Câmara local e seu genro, Alfredo Ellis, como senador da República”.

 

Novas tecnologias no horizonte

A força do café trazia novas tecnologias. Além da ferrovia, que chegou em 1884, o telegrama, a eletricidade e outras novidades se inseriam ao cotidiano. “São Carlos estava há 15, 20 anos de investimento sistemático na produção cafeeira, o que já havia gerado recursos e capitais que poderiam reverter no desenvolvimento e transformação da cidade, inclusive na mudança de seu centro político, do campo para a cidade, mas com as mesmas pessoas no governo. A década de 1890 deu início ao primeiro grande surto de crescimento, com a ampliação do núcleo urbano, de serviços, de novas técnicas , tecnologias, profissionais e grupos sociais. Esse processo continuou logo após a proclamação e perdurou até, pelo menos, o começo dos anos 1930, quando as conjunturas econômicas e políticas, mais uma vez, causaram transformações aqui e em todo o país”, explica Leila.

No período em que a República, São Carlos gestava uma verdadeira “Torre de Babel”, com gente de várias nacionalidades formando a cidade. Mas este processo foi realizado com a exclusão dos afrodescentes, que após libertos, foram entregues à própria sorte. “Esse processo estava se iniciando e vai ser sentido plenamente no começo do século XX, quando a população imigrante era muito grande frente aos nacionais. Mas, por outro lado, o abandono dos ex-escravizados no pós-abolição fez com que muitos dessa população fossem embora da região ou que se estabelecessem em suas periferias e mesmo nas fazendas, vivendo um processo que mantinha sua posição subalterna e com poucas oportunidades, numa cidade que crescia para imigrantes e nacionais ‘brancos”, relata a historiadora.

Recomendamos para você

Comentários

Assinar
Notificar de
guest
0 Comentários
Comentários em linha
Exibir todos os comentários
0
Queremos sua opinião! Deixe um comentário.x