Sobre Zé Parrella
Texto de Henrique Affonso de André foi repórter do Primeira Página entre 2000 e 2005
Eu não conheço Zé Parrela pessoalmente, da forma propriamente dita. Meu contato com ele foi no máximo de algumas entrevistas, nenhuma exclusiva. Hoje, passados 20 anos de sua posse, a qual cobri pelo Primeira Página, e o vendo deixar o poder – direto ou indireto -, me senti motivado a escrever alguma coisa sobre o que testemunhei, não só naquela posse, mas também nos últimos 20 anos. Não quero louvá-lo nem atacá-lo. Tenho muitos amigos na cidade, alguns gostam muito, outros detestam. Eu só posso dizer que conheci a cidade antes e conheço hoje, e me sinto devedor a dar-lhe o devido crédito. À época, eu comentei que ele terminaria o primeiro mandato e nunca mais se candidataria, pelo fato de ser empresário e que não teria paciência para aguentar a morosidade da gestão pública. Eu estava errado.
Era estranho, de certa forma, um empresário de seu estilo no PCdoB. Um amigo nosso em comum me dizia “única coisa comunista dele é que ele gosta de roupa vermelha”. Ligado ao agronegócio, meses antes da campanha seus caminhões começaram a carregar adesivos com o número 65. Era uma forma de propaganda antecipada que hoje em dia não passa mais. Seus adversários começaram a fazer o mesmo.
Naquela época, tudo ficava na esquina da Santa Iria com a Paulino Carlos. A Câmara no andar de cima, a Prefeitura no andar debaixo e o clima era de que as coisas somente andavam porque era obrigatório. Era difícil encontrar informação, as secretarias dividiam salas e a impressão era de que a administração apenas tocava a cidade do jeito que dava. Havia muita gente empenhada, nos bairros, nas escolas, na economia, mas a impressão que eu tinha é que a vontade de alguns não era suficiente para suplantar a inércia de outros.
Foram seis candidatos, entre eles o hoje prefeito eleito Ronaldo Venturi. Parrela ganhou com cerca de 40%, ficando em segundo o então prefeito Tomazinho Rocitto com cerca de 15%. Os demais candidatos ficaram todos em torno de 10%, uma eleição que seria acirrada sem a presença do industrial. Era natural que em algum momento isso levasse a uma reação, a um movimento por uma novidade. Em 50 anos apenas 8 pessoas haviam ocupado a prefeitura, muitas vezes de forma picada. E além do prefeito, que não tinha experiência política anterior, a renovação na Câmara foi grande. Se não me engano o único a se reeleger na Câmara foi João Siqueira. Tudo seria novo.
Hoje em dia eu acordo cedo, mas na época tinha 23 anos e talvez fosse o primeiro Ano Novo que acordava cedo na vida. A presidente do PCdoB estadual, Nádia Campeão, estava presente para prestigiar a posse do único candidato eleito pelo partido em São Paulo. Não sei se ela o conhecia antes, porém, ele passava longe de qualquer estereótipo que à época tínhamos de membros do PCdoB, a não ser a cor da camisa. Em um terno branco, camisa vermelha sem gravata e correntes de ouro da grossura de um dedo, ele tomou posse garantindo que as coisas mudariam. Desceu do plenário da Câmara, foi se reunir com as pessoas que estavam na frente do prédio e num gesto simbólico jogou a chave da prefeitura para o alto, dizendo que agora a prefeitura era do povo.
Eu segui cobrindo por mais uns meses Ibaté e a transição do governo. Diziam que “cada gaveta que abria tinha uma conta para pagar”, e era verdade. Tínhamos acesso a documentos que mostravam que realmente a cidade tinha sido gerida de uma forma muito arcaica, com pouco controle sobre o arrecadado, o gasto e o pago. Ele até chegou a perguntar aos seus assessores se podia ser avalista de alguns empréstimos, pois eram várias as verbas bloqueadas por falta de prestação de contas.
Não demorou muito para eu perceber que a cidade estava mudando. As ruas, os canteiros, os prédios públicos, tudo começou a melhorar visivelmente. Eu saí do Primeira Página para trabalhar em outro lugar em abril de 2005 e não acompanhei como repórter o dia-a-dia da cidade. Logo ele saiu do PCdoB, com o qual ele tinha zero identificação, e foi para o PSDB, facilitando a interlocução com o governo do Estado.
Óbvio que alguns reclamavam de aspectos de sua gestão, como é devido que uma população faça com qualquer governante, porém eu percebia que a cada dia que visitava a cidade que ela mudava, parecia melhor que da última vez. Em 20 anos ele se reelegeu, elegeu o secretário, acabou elegendo a mulher em um mandato tampão, e voltou, se reelegeu. Todo grupo político se desgasta, o substituto escolhido desta vez não foi suficiente para herdar seu prestígio, e novamente a população escolheu pela mudança, como escolhera em 2004. Apesar do que possam reclamar, não há como negar: Ibaté mudou muito rapidamente naquele primeiro mandato e seguiu mudando, e a população reconheceu isso por 20 anos, mantendo Parrella e seu grupo no poder. Ibaté era uma cidade que eu nem gostava muito de ir, e hoje é uma cidade que eu gostaria de viver. Tenho quase certeza que o prefeito eleito Ronaldo Venturi fará um bom mandato. É o que todos esperam. E ele sabe, que apesar das diferenças e discordâncias naturais que possam ter, que hoje assume a Prefeitura em condições muito, mas muito melhores, do que aquelas que Zé Parrela recebeu.