Um a cada cinco negros que moram em zona rural ainda é analfabeto
Embora
a escolarização venha avançando nos últimos anos, o País ainda tem um longo
caminho a percorrer para reduzir as desigualdades raciais no campo da educação.
Um em cada cinco negros que vivem em zonas rurais ainda é analfabeto, ou seja,
está entre as pessoas com pelo menos 15 anos de idade que não sabem ler nem
escrever. Os dados são do Estudo Desigualdades Sociais por Cor ou Raça,
divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) nesta
quarta-feira, 13.
A taxa de analfabetismo de pretos e pardos (9,1%) é mais do que o dobro do que
a dos brancos (3,9%). Na zona rural, a taxa de analfabetismo de pretos e pardos
sobe a 20,7%, contra 11% dos brancos. Mesmo em áreas urbanas, o analfabetismo é
mais de duas vezes maior entre negros: a taxa de analfabetismo de brancos é de
3,1%, enquanto a de pretos e pardos é de 6,8%.
A taxa ajustada de frequência escolar líquida – que frequentam a etapa escolar
na idade adequada – mostra que as desigualdades raciais se aprofundam conforme
avança o nível de ensino. Em 2018, havia uma pequena diferença entre as proporções
de crianças de 6 a 10 anos brancas e pretas ou pardas cursando os anos iniciais
do ensino fundamental (96,5% e 95,8%, respectivamente).
No entanto, a proporção de jovens de 18 a 24 anos de cor branca que
frequentavam ou já tinham terminado o ensino superior (36,1%) era quase o dobro
da registrada entre os pretos ou pardos da mesma faixa etária (18,3%).
Desigualdade racial até entre os mais ricos – A desigualdade de
escolarização persiste mesmo quando comparadas as populações brancas e pretas
ou pardas por faixas de renda, incluindo a população mais abastada. Entre os
20% da população com maiores rendimentos per capita, a evasão escolar de jovens
adultos com 18 a 24 anos era de 4,3% entre os brancos. Entre os negros nessa
faixa etária, essa evasão subia a 7,6%.
“Mesmo quem está no quinto de maiores rendimentos, há desigualdade entre
população branca e preta ou parda. Não é só questão de rendimento”,
observou a analista da Coordenação de População e Indicadores Sociais do IBGE,
Luanda Botelho.
A taxa de ingresso da população preta ou parda no nível superior (35,4%) é
menor do que a da população branca (53,2%). O problema já está presente na
etapa anterior: a taxa de conclusão do ensino médio da população preta ou parda
(61,8%) é que a da população branca (76,8%).
Saneamento básico – As desigualdades raciais persistentes no País também
se refletem nas condições de moradia dos brasileiros. O Brasil tem quase três
vezes mais negros do que brancos vivendo com ao menos uma restrição de acesso
ao saneamento básico.
Na população que habitava em moradias com alguma deficiência no saneamento em
2018, 69,404 milhões eram pretos ou pardos, outros 25,015 milhões eram brancos.
No ano passado, era maior proporção da população preta ou parda residindo em
domicílios sem coleta de lixo (12,5%, contra uma fatia de 6% da população
branca), sem abastecimento de água por rede geral (17,9%, contra 11,5% da
população branca), e sem esgotamento sanitário por rede coletora ou pluvial
(42,8%, contra 26,5% da população branca).
O resultado significa que os pretos e pardos estão em maior condição de
vulnerabilidade e exposição a vetores de doenças, lembrou o IBGE.
Os negros também têm menos acesso aos bens duráveis do que os brancos. Em 2018,
44,8% da população preta ou parda residia em domicílios sem máquina de lavar
roupa, o dobro da fatia da população branca nessa mesma condição (21%).
População negra ou parda em desvantagem; origem histórica – Para os
pesquisadores do IBGE, as desigualdades étnico-raciais têm origens históricas e
são persistentes, levando a população preta ou parda a sofrer “severas
desvantagens” em relação à branca em indicadores do mercado de trabalho,
distribuição de renda, condições de moradia, educação, violência e
representação política.
“Os ciclos econômicos do País ao longo de 300 anos tiveram pilar no
trabalho escravo. Formalmente, a liberdade tem 130 anos. E esse desenvolvimento
econômico ao longo da sua história construiu uma estrutura social que os
indicadores estão mostrando, esses números não estão soltos”, justificou
Claudio Crespo, analista da Coordenação de População e Indicadores Sociais do
IBGE. “Tem indicadores de transformação, mas a distância social ainda é
bastante relevante, tem uma raiz histórica. A posse da terra, a valorização
cultural, a estigmatização que ao longo dos anos os pretos e pardos são
submetidos.”
Segundo dados de 2017, uma pessoa preta ou parda tinha 2,7 vezes mais chances
de ser vítima de homicídio intencional do que uma pessoa branca. A taxa de
homicídios era de 16 entre as pessoas brancas e de 43,4 entre as pretas ou
pardas a cada 100 mil habitantes.