PF investiga personagem que estimula, na web, crianças a se mutilarem
De acordo com os agentes, um perfil com o nome de Jonatan Galindo nas redes sociais está promovendo os vídeos
Um homem vestido com uma
máscara do personagem Pateta, da Disney, estaria induzindo crianças e
adolescentes a se mutilarem A Polícia Federal (PF) passou a investigar o caso
e, de acordo com os agentes, um perfil com o nome de Jonatan Galindo nas redes
sociais está promovendo os vídeos. O intitulado “Homem Pateta” ensina
táticas de mutilação e induz crianças a cometerem suicídio. A Polícia Federal
também informou que o suspeito lança desafios em que o personagem dá instruções
e pede para que as crianças as sigam. As respostas podem ser enviadas por
mensagens de texto, vídeos e até ligações ao vivo, que logo são excluídas pelas
vítimas a pedido de Jonatan.
De acordo com investigações da Polícia Federal,
o “Homem Pateta” teve seu perfil criado em 2017 na Europa e no
México. Algumas contas com codinome Jonatan Galindo já apresentam conteúdo em
português.
A PF alerta os pais a manterem um vínculo de
amizade e cumplicidade com os filhos, ter um conhecimento básico sobre
internet, computação e redes sociais. Os responsáveis devem evitar altas
exposições dos filhos online, seja por fotos ou vídeos, além de acompanhar os
conteúdos consumidos pelas crianças.
Na avaliação do psiquiatra Rodrigo de Almeida
Ramos, o risco é limitado, porém, a prática da automutilação tem origens mais
complexas e envolve a perda de controle do indivíduo tanto no mundo interno
quanto no externo. “Além disso, mais de 90% dos casos de suicídio envolvem
uma doença mental como depressão ou transtorno bipolar. De tal sorte, que para
praticar a automutilação e o suicídio, o adolescente tem que estar minimamente
doente. Pessoas sadias mentalmente dificilmente tornam-se presas para
atividades psicopáticas de pessoas desconhecidas”, afirma.
Ao mesmo tempo, o especialista reitera que isso
não desobriga os pais a estarem sempre atentos ao que os filhos veem na
internet. “O adolescente, por ainda não ter a parte cerebral relacionada
ao controle dos impulsos totalmente desenvolvida, pode ter acesso a materiais
que ainda não tem condições de compreender e isso deixá-lo ansioso. E ainda
promover um compartilhamento desse material entre amigos que, então, pode
chegar a um adolescente vulnerável. Tivemos recentemente o caso da boneca Momo
que, embora tenha gerado um estado de alerta na sociedade, não refletiu em
aumento de casos de automutilação ou suicídio”, conclui.
Recomendações
Em tempos de pandemia, em que as crianças e os
adolescentes estão cada vez mais atuantes na internet, a exposição a esse tipo
de conteúdo preocupa. A pedido da reportagem, o psiquiatra Ricardo Abel
Evangelista apresentou duas formas de como os adultos podem interferir no risco
de comportamentos induzidos de automutilação ou suicídio pelas crianças. Uma
forma tem a ver com a presença de longo prazo dos pais na vida da criança e
outra com intervenções mais imediatas quando os riscos já estão instalados.
Confira:
1: Intervenção mais longa – Crianças com boas referências adultas tendem a
desenvolver melhor a noção do que é vida real e o que é fantasia, aumentando
está fronteira com seu amadurecimento e medindo cada vez melhor as
consequências de seus atos. Este é um processo de longo prazo que ocorre porque,
com pais presentes e participativos, elas vão recebendo desde sempre noções
limitadoras (certo e errado, bem e mal, por exemplo) e, acima de tudo, forma-se
o vínculo de confiança necessário para que ela fale sobre o que acontece em seu
mundo com os pais. Assim, eles podem fazer novas orientações, incentivar os
bons comportamentos e inibir os ruins. Quando a presença parental é falha,
surge um vão nas demandas por acolhimento que a criança naturalmente tem,
tornando-se assim mais vulnerável a orientações provenientes de outras figuras
de afeto substitutas – mesmo que tal figura seja um personagem de internet.
2: Intervenção mais imediata – A primeira e mais óbvia é a recomendação de que
os pais precisam ter ideia de quais conteúdos os filhos visitam na rede mundial
e filtrem isso por eles. Crianças estão em desenvolvimento cognitivo e
intelectual, são naturalmente curiosas, e precisam de certo balizamento ao
longo da infância para que, aos poucos, elas desenvolvam os próprios filtros.
Contudo, além deste comportamento vigilante dos pais, talvez ainda mais valioso
que isto seja a atitude afetiva e acolhedora destes. Há que se ter os momentos
de firmeza na contenção de certos comportamentos da criança – quem é pai ou mãe
sabe disso – mas o laço afetivo permite que a criança confie nos adultos e
conte as coisas que viu e ouviu, servindo como alerta aos pais. Caso se detecte
algo suspeito na fala da criança, os pais não devem mostrar descontrole, mas
terminar de ouvir e explicarem com a maior calma e firmeza possíveis que aquilo
não seria certo, não tem cabimento, ou algo assim. A segunda atitude, aí sim, é
impor filtros aos sites visitados pela criança. Embora isso pareça muito óbvio,
no mundo atual onde casais trabalham bastante (fora de casa ou em home office)
o grande desafio é dedicar o tempo necessário atendendo os filhos com diálogo,
brincadeiras, orientações e, por que não, ensinando certos limites.
Caso a criança persista com ideias ou atos de
automutilação, ou com falas sobre suicídio mesmo após a interferência dos pais,
então, a avaliação psicológica e psiquiátrica será fundamental para que as
causas daqueles atos sejam melhor elucidadas e tratadas.