A saúde mental nos estudantes universitários
Até há pouco tempo atrás, pouco se falava ou estudava sobre saúde mental
O que acontece na vida dos jovens que ingressam na universidade? Certamente é um momento em que são apresentadas aos jovens outras realidades e demandas sociais, psicológicas, cognitivas e emocionais, o que exige novos recursos de adaptação. Quando se pensa em novas demandas quando se ingressa em uma universidade, dentro de um período normal (que não pandêmico), logo temos, como primeira análise os jovens saírem de casa dos pais, de uma vida supostamente estabilizada ao longo de anos, para se tornarem em indivíduos independentes, adquirindo novas responsabilidades, começando pelas mais simples – aluguel de um local para morar, administração do dinheiro, planejamento e aquisição de alimentos, a gestão das contas domésticas, organização da rotina de horários, o medo do insucesso acadêmico em face ao nível de exigência dos cursos, dedicação total aos estudos, etc.. Importante destacar que se torna necessário avaliar sempre a questão do histórico individual do jovem que entra na universidade, ou seja, como está a vida dele? Teve ou tem alguma condição de sofrimento psicológico? Tem uma família que dá suporte emocional e acolhedor, independente do apoio financeiro? Quando pensamos em um período como o que se vive atualmente – pandêmico -, os jovens universitários confrontam-se com dificuldades acrescidas – organizar o ambiente doméstico para poder estudar e programar toda sua vida para acompanhar as aulas remotas, um índice alto de concentração e uma organização temporal para que ele não se desvincule de sua responsabilidade maior, que é estudar. É bem diferente do que um contexto acadêmico de sala de aula, onde você tem um horário determinado para estar lá, para se confrontar obrigatoriamente com o professor e com a matéria. Em suma, o ingresso de um jovem na universidade implica afirmar que ele tem ali uma série de mecanismos de adaptação acionados.
Riscos
Até há pouco tempo atrás, pouco se falava ou estudava sobre saúde mental, o que equivale a dizer que essa área não era importante, haja visto que os primeiros estudos realizados no Brasil datam de 1957, tendo sofrido alguns desenvolvimentos até ao momento atual, mas ainda com um olhar bastante distante. Por exemplo, dados relativos ao ano de 2004, divulgados pelo Forum Nacional de Pró-Reitores de Assuntos Comunitários Estudantis (FORNAPRACE), mostraram que das 40 universidades participantes só 34% tinham serviços de atenção à saúde mental dos estudantes, sendo que, quinze anos depois (2019), segundo o mesmo Forum e tendo como base o perfil sócio-econômico e cultural dos estudantes de graduação das universidades federais, 83,5 dos estudantes tinha dificuldades emocionais que interferiam em sua vida acadêmica: desses, 11,1% encontravam-se em tratamento psicológico; 63,7% nunca procuraram atendimento psicológico; 7,5% tomavam medicação psiquiátrica. Ainda, podemos aqui salientar um estudo realizado por Moretti & Hubner, em 2017, relativo a uma avaliação de níveis de estresse de 102 alunos pertencentes a uma universidade particular de São Paulo, onde 93% apresentavam sinais indicativos da necessidade de receberem cuidados em relação ao estresse. Estes indicadores precisam ser olhados no contexto acadêmico, já que, para além de doenças, eles podem levar a um baixo desempenho dos alunos e, por consequência, a elevados índices de evasão, já para não falar em suicídios. Os principais adoecimentos estão relacionados com depressão, estresse, ansiedade, distúrbios alimentares, uso e abuso de álcool, drogas, cafeína e medicamentos, entre outros fatores.
Soluções
A necessidade e urgência na criação de programas de apoio psicológico aos estudantes universitários são ações prementes para que situações como são descritas acima não prevaleçam. O exemplo vem do Instituto de Física de São Carlos (USP), traduzido num suporte institucional realizado pela psicóloga Drª Bárbara Kolstok Monteiro, com acompanhamentos periódicos, palestras e oferecimento de condições que favoreçam uma boa saúde mental, sem tabus, ações essas que são extensivas aos professores. Cuidar da saúde mental dos estudantes universitários é um componente extremamente importante, não só tendo em vista um bom desenvolvimento profissional, como também pessoal. Cada vez mais se aposta na valorização das “Soft-Skills”, das habilidades sociais para o mercado de trabalho, mas isso não se desenvolve em uma aula de cálculo, ou em outra qualquer. O que é necessário é ter condições que favoreçam o desenvolvimento dessas habilidades e um ambiente preparado para estimular esse desenvolvimento, necessariamente programado e sistematizado, para que se evite que pessoas que apresentem mais dificuldades de comunicação – por timidez, por exemplo – fiquem desfavorecidas em relação a outras mais desinibidas, quando os graus de conhecimento se apresentam iguais.
Rui Sintra – Jornalista IFSC/USP
Bárbara Kolstok Monteiro – Psicóloga IFSC/USP